Embora ainda pouco conhecida pela nossa população, o LES - lúpus eritematoso sistêmico não é uma doença rara e suas características necessitam ser mais divulgadas, para que indivíduos com manifestações da doença possam procurar ajuda, uma vez que o seu reconhecimento precoce é da maior importância para o prognóstico.
Embora não se saiba com precisão o número total de casos de lúpus no nosso meio, calcula-se que deva existir um total de mil casos, só na cidade do Salvador. Curiosamente, nos Estados Unidos a doença é três vezes mais comum em negros que em brancos e se isso for verdade para a população da Bahia é claro que o número de casos de lúpus poderá ser muito maior do que o citado acima. A doença ocorre predominantemente em mulheres jovens (20 a 50 anos), embora crianças e idosos também possam ter a doença.
SINTOMAS :
Os sintomas do lúpus são muito variados e os pacientes referem freqüentemente dor e inchação em articulações, manchas no rosto que são sensíveis à exposição solar conhecidas como “asa de borboleta”, queda intensa de cabelos, febre e perda de peso, inflamação de pleura (membrana que recobre o pulmão), queda de glóbulos brancos no sangue (leucopenia) e inchação em todo o corpo devido a alterações renais. É importante salientar que o lúpus pode ser uma doença limitada à pele, sem envolver órgãos internos, mas recomenda-se que mesmo nesses casos o paciente deva fazer uma avaliação com um reumatologista, que é médico que trata desse problema, pois muitas características da doença podem ser detectadas apenas com exames laboratoriais.
É também muito importante lembrar que a despeito de envolver a pele, o lúpus não “pega” ou “passa” para pessoas próximas. Do mesmo modo, a doença não é hereditária, ou seja, não passa de pai para filho, embora seja possível encontrar mais de um caso com o problema na mesma família.
DOENÇA SEM CAUSA CONHECIDA :
Uma pergunta muito comum é sobre a causa do lúpus. Infelizmente, essa doença não tem causa conhecida, mas sabe-se que o que ocorre é uma alteração no sistema imunológico do indivíduo. Esse sistema normalmente é responsável pelas defesas do organismo ao produzir anticorpos que agem contra microorganismos, como bactérias e vírus. Por razões ainda não conhecidas, no lúpus o sistema imunológico do indivíduo passa a produzir anticorpos contra suas próprias células, levando a lesões de diversos órgãos. Por essa razão ela é incluída no grupo das doenças “auto-imunes”. E é baseado nesse princípio que utiliza-se como exame para diagnóstico a pesquisa de anticorpos contra núcleo de células humanas (FAN).
TRATAMENTO :
Por se tratar de uma doença com manifestações tão variadas o tratamento não pode ser generalizado para todos os pacientes e varia com o grau de complexidade da doença. As medicações mais usadas são os corticóides, antimaláricos e os chamados imunossupressores para inibir o sistema imunológico do paciente e assim controlar a doença. Além disso, os pacientes devem evitar exposição ao sol que pode piorar a doença. A gravidez não está contra-indicada para pacientes com lúpus, mas essa deve ser bem planejada e no período em que a doença esteja sob controle.
Ainda no que concerne ao tratamento do lúpus, os pacientes do SUS têm obtido as medicações chamadas de “alto custo” graças a um programa do Governo Federal/Secretaria de Saúde do Estado e a colaboração do Serviço de Reumatologia do Hospital Santa Izabel (HSI). Os pacientes recebem um documento de autorização no Hospital Santa Izabel e são encaminhados aos Hospitais Manoel Vitorino (Nazaré) e Ernesto Simões (Caixa D’água) para a retirada da medicação, sem muita burocracia.
Uma recente conquista para os pacientes com lúpus de Salvador foi a aquisição de medicação mais utilizada para a doença, que é o corticóide prednisona e o protetor solar, ambas sendo liberadas pela Secretaria de Saúde do Município no Posto da Rua Carlos Gomes, após obtenção de receita médica no HSI. Essa conquista abre um precedente para que as prefeituras das outras cidades do Estado assumam a mesma conduta.
SITUAÇÃO DO ATENDIMENTO AOS PACIENTES COM LÚPUS PERTENCENTES AO SUS NA BAHIA
O Ambulatório de Lúpus do Hospital Santa Izabel é o centro de referência para o atendimento de lúpus na Bahia. Esse ambulatório foi fundado há dez anos e recebe pacientes de todo o Estado. Nele são atendidos atualmente 620 pacientes pertencentes ao SUS.
Infelizmente, mesmo com uma equipe de quatro médicos, residentes e estudantes de medicina e atendendo em oito salas simultaneamente, esse ambulatório não suporta toda a demanda de casos da Bahia, fazendo-se necessário a ampliação desse serviço ou a criação de uma outra unidade com esse objetivo.
Um outro agravante para pacientes com lúpus é a insuficiência de leitos hospitalares para eventuais internações, pois atualmente, os leitos do Hospital Santa Izabel não são suficientes para suprir toda a demanda do Estado e não existe um programa do governo específico para a internação desses pacientes. A falta de vagas pode ser responsável por um maior número de pacientes encaminhados para a diálise por ter o tratamento retardado ou mesmo maior índice de óbitos nessa população.
As dificuldades do paciente com lúpus também existem no que se refere à realização de exames para diagnóstico e acompanhamento da doença, uma vez que poucos laboratórios realizam os exames específicos para lúpus pelo SUS e não existe no nosso meio nenhuma unidade laboratorial do serviço público que atenda especificamente a essa necessidade.
CRIAÇÃO DA LOBA (LÚPICOS ORGANIZADOS DA BAHIA)
Em 2004 os pacientes e familiares de portadores de lúpus decidiram se reunir e fundar uma associação, que levou o nome de LOBA (lúpicos organizados da Bahia). Nome bastante apropriado para os pacientes com lúpus, uma vez que a palavra lúpus em latin significa “lobo”, se referindo a uma mancha avermelhada que aparece na face dos pacientes, que pode lembrar um lobo.
Os objetivos dessa associação são os de integrar pacientes com lúpus, atualizar sobre novos recursos diagnósticos e terapêuticos, obter medicações necessárias para o tratamento, obter facilidades para os pacientes, como passes de ônibus, bolsas de estudo, etc.
Por : Dr Mittermayer Barreto Santiago - Reumatologista, responsável pelo Núclo de Reumatologia do Hospital Santa Izabel.